Em decorrência do empregador ser o responsável por investir o capital no empreendimento, escolhendo o rumo do negócio, inclusive com o investimento em diretrizes de atividade, tem ele, em contrapartida o risco de sua atividade. Com isso, pode também intervir nas relações de emprego, pois tem o poder de comando[1].
Assim, o poder empregatício caracteriza-se pelo “conjunto de prerrogativas com respeito à direção, regulamentação, fiscalização e disciplinamento da economia interna à empresa e correspondente prestação de serviço”[2].
Ressalta-se que este poder se divide em quatro faces[3]: poder diretivo, ou também chamado de poder organizativo; poder regulamentar; poder fiscalizatório, conhecido também como poder de controle; e poder disciplinar.
O poder diretivo do empregador é aquele poder de comando, com prerrogativas direcionadas à organização do espaço e estruturas internas, inclusive no tocante aos procedimentos internos que são adotados pelo estabelecimento, com suas respectivas especificações quanto à prestação de serviço[4].
Pode-se, também, conceituar o poder diretivo como aquele que vai “determinar as regras de caráter predominante técnico-organizativas que o trabalhador deve observar no cumprimento da obrigação”[5]. Através desse “o empregador dá destinação correta às energias de trabalho (...) que o prestador é obrigado a colocar e conservar à disposição da empresa da qual depende”[6].
Já o poder regulamentar é tido como “(...) o conjunto de prerrogativas tendencialmente concentradas no empregador dirigidas à fixação de regras gerais a serem observadas no âmbito do estabelecimento e da empresa”[7], a exemplo disto, os contratos individuais de trabalho firmados entre empregador e empregado. Ainda:
Para a vertente interpretativa dominante a atividade regulamentar seria simples meio de concretização externa das intenções e metas diretivas colocadas no âmbito do estabelecimento e da empresa. De fato, não se pode negar que sem a linguagem escrita e verbal não haveria, simplesmente, forma de como o poder diretivo dar-se a conhecer no universo material e jurídico [8].
O poder regulamentar não tem o condão de produzir normas jurídicas, mas sim e somente, cláusulas contratuais, aplicáveis ao contrato individual de trabalho firmado entre as partes (empregado e empregador), a fim de regulamentar a atividade laboral prestada, nos moldes da vontade das partes.
Porém, embora haja um acordo de vontades, percebe-se que na maioria dos casos, o contrato firmado é fruto de vontade unilateral, ou seja, o empregador dita as regras as quais pretende para a função que venha desempenhar o empregado. Por tal razão, e ainda pela natureza e influência do direito público no âmbito trabalhista, o contrato de trabalho firmado entre as partes é considerado meramente como simples cláusulas contratuais, existindo limites para tanto.
As partes (empregado e empregador) não poderão fixar cláusulas de trabalho contrárias ao disposto na legislação brasileira e aos princípios da dignidade da pessoa humana, dos bons costumes, da segurança e do bem-estar, entre outros.
Outro fenômeno que caracteriza os poderes do empregador, nas relações trabalhistas, é o poder fiscalizatório, ou também chamado de poder de controle, que se caracteriza pelo direito que tem o empregador de fiscalizar as atividades dos seus empregados, uma vez que, como forma de contrapartida, lhes paga salário [9].
É o poder de fiscalização que garante ao empregador a possibilidade de fiscalizar seus empregados através de câmeras de vídeo nos locais de trabalho, bem como que possibilita que empregador obrigue seus empregados a assinarem o cartão ponto. Além disto, é a através do poder fiscalizador que detêm o empregador que, em determinados casos, o garante em ter o direito a fazer revista em seus empregados.
Por fim, o empregador possui também poder disciplinar, que se fundamenta nas seguintes teorias: a) teoria negativista; b) civilista; c) penalista; e) administrativa[10].
Para a teoria negativista, “o empregador não poderá punir o empregado, pois o direito de punir pertence ao Estado, que detém o direito privado inerente ao iunis puniend”[11].
Já aos adeptos da teoria civilista, ou também conhecida como teoria contratualista, entendem que a referia teoria “estabelece que o poder disciplinar decorre do contato de trabalho”, portanto, “as sanções disciplinares estariam equiparadas às sanções civis, como se fossem cláusulas penais”[12].
A teoria penalista “defende que o poder disciplinar é similar ao poder punitivo do Estado contra o criminoso”[13]
Sobre tudo, Cassar [14]conclui:
O poder disciplinar decorre do poder diretivo, facultando ao empregador aplicar punições ao empregado quando este descumprir o contrato de forma a abalar a relação existente entre eles. Três são os tipos de punições e a aplicação destas fica sob o crivo do empregador: repreensão ou advertência, suspensão e justa causa.
O poder disciplinar, respeitado os limites aos poderes do empregador, pode acarretar a repreensão ou advertência, a suspensão do contrato de trabalho ou até mesmo a rescisão do contrato por justa causa.
Ao que se refere à repreensão ou advertência, embora não tipificado em texto legal, esta não é irregular, tendo origem principalmente nos costumes trabalhistas, sendo aceita, inclusive, pela doutrina e jurisprudência, que entende que a gradação de penalidades é um dos critérios essenciais para a aplicação de sanções, ao que se refere o contexto empregatício[15].
Ainda, antes da conceituação da penalidade de suspensão e justa causa, há uma forte divergência doutrinária ao que se refere a penalidade de multa, Delgado[16], nesse sentido, entende que “[...] de maneira geral, a pena pecuniária é vedada no direito do trabalho, por afrontar os princípios da intangibilidade e irredutibilidade salarias, agredindo, ainda, a regra disposta no art. 462 da CLT”, com exceções ao contrato de atleta profissional, por exemplo.
Quanto a possibilidade do empregador suspender o contrato individual de trabalho de seu empregado, como forma de punição, Cassar[17] entende que será possível a aplicação desta punição, quando o empregado praticar faltas mais graves, porém não tão graves ao ponto de rescindir o contrato por justa causa, mas nem tão leves ao ponto de que uma repreensão seria suficiente. Assim, quando do cometimento de uma falta deste importe, o empregado não recebe salário e a suspensão disciplinar não poderá exceder 30 (trinta) dias, sob pena de rompimento do contrato sem justa causa.
Ainda, no caso do cometimento de uma falta grave, há a possibilidade da rescisão do contrato por justa causa.
Sobretudo, limites existem.
Analisando a legislação vigente no Brasil, percebe-se que não foram estabelecidos critérios claros quanto aos limites ao empregador nas relações contratuais trabalhistas.
Atualmente, o que rege e impõe os limites ao poderes do empregador são os princípios norteadores e gerais do regime jurídico, em situações concretas.
A título de exemplificação de um sistema que impõe contornos claros, cita-se o Estatuto dos Direitos dos Trabalhadores da Itália – Lei n. 300 de 1970[18].
O referido estatuto prevê em seus artigos normas que limitam os poderes do empregador, a fim de garantir os princípios da dignidade da pessoa humana e da harmonia social. O artigo 2º deste Estatuto veda o “uso de instalações audiovisuais de outros aparelhos com fins de controle a distância das atividades dos trabalhadores”.
Ou seja, a legislação italiana estabeleceu limites aos poderes dos empregadores, diferente do que hoje é aplicado no ordenamento jurídico brasileiro que não tem legislação específica quanto ao assunto.
Muito embora, de modo intrínseco, possuímos princípios que norteiam estas relações. Neste sentido, extrai-se da obra de Delgado[19]:
É inquestionável que a Carta Constitucional de 1988 rejeitou condutas fiscalizatórias e de controle da prestação de serviços que agridam a liberdade e dignidade da pessoa física do trabalhador. Tais condutas chocam-se, frontalmente, com o universo normativo e de princípios abraçado pelo Constituição vigorante. É que a Constituição pretendeu instituir um “Estado Democrático, destinado a assegudar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social...” (Preâmbulo da CF/88).
Na legislação brasileira, pode-se citar, como exemplo das garantias e limites que o empregador deve respeitar o artigo 5º, caput, da CRFB/88[20], “[...] a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. Ainda, preservando a integridade física e moral do empregado, cita-se o inciso III do artigo 5º da CRFB/88 que diz: “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”.
Além dos princípios acima citados para a aplicabilidade de alguma punição, Cassar[21] entende que esta deverá atender alguns requisitos, dentre eles a punição deverá ser de forma imediata ou atual, deve haver a proporcionalidade entre a falta e a punição, não ser discriminatória e não haver mais que uma punição pela mesma “falta”.
[1] CASSAR, Volia Bomfim. Direito do trabalho. p. 835.
[2] DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. p. 590.
[3] DELGADO. p. 590.
[4] DELGADO, p. 592.
[5] SANSEVERINO, Luiza Riva. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1976. p. 207.
[6] SANSEVERINO, p. 207.
[7] DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. p. 592.
[8] DELGADO, p. 593.
[9] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho, p. 206.
[10] MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 193
[11] MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. p. 193.
[12] MARTINS, p. 193.
[13] CASSAR, Volia Bomfim. Direito do trabalho. p. 835.
[14] CASSAR, Volia Bomfim. Direito do trabalho. p. 837.
[15] DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. p. 623.
[16] DELGADO, p. 625.
[17] CASSAR, p. 838.
[18]ITALIA. Lei 300/70 .Statuto dei dirittti dei lavoratori. <http://www.dielle.it/index.php?url=/consultazione/leggi_1/l_30070_statuto_dei_dirittti_dei_lavoratori_16/view/16/#02> Acessado em 01 de abril de 2011.
[19] DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. p. 595.
[20] BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil. Vade Mecum universitário. São Paulo: TR, 2009. p. 14
[21] CASSAR, Volia Bomfim. Direito do trabalho. p. 842.
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